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Barbate – Terra de Almadrabas e Atum Selvagem

Barbate – Terra de Almadrabas e Atum Selvagem

O Sol ainda não nasceu sobre o baía de Barbate, mas isso não impede os homens que se encontram no porto piscatório da cidade, de se apressarem com os últimos preparativos para irem para o mar, em busca do rei dos peixes … “Lo Atun Rojo” como por aqui lhe chamam; o atum dos atuns, como lhe chamou Ernest Hemingway, depois de ver cardumes de atuns-rabilhos, quando tal como nós, percorreu esta costa espanhola, em busca desta milenar rota migratória e de uma tradição de pesca que se perde nos tempos.

Foram meses de preparação. Ao largo já se encontram montadas as Almadrabas e dizem-nos que é chegada a altura … que eles já atravessam as águas do estreito.

Vão a caminho da desova … a caminho do Mediterrâneo. Rápidos como torpedos, os seus dorsos brilham por entre estas águas cristalinas e as suas barbatanas são inconfundíveis, assim como a sua grande envergadura e o seu porte majestoso.

O cerco da almadraba fecha-se … os homens gritam “arriá, arriá” e dão inicio ao “levante”.

Mais do que uma fascinante viagem gastronómica, esta é uma viagem onde assistimos ao conciliar da história, da cultura e das tradições, com a sustentabilidade dos ecossistemas e o respeito e preservação pelo meio ambiente. Estamos na pequena cidade piscatória de Barbate e viemos descobrir o porquê de lhe chamarem a Capital do Atum Vermelho.  

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Almadrabas ao largo de Barbate e Zahara de Los Atunes - Alma de Aventureiros - Créditos Cadiz Turismo

Atun Rojo de Almadraba - Barbate - La Chanca - Alma de Aventureiros

 

ℹ️ A Milenar Rota do Atum Vermelho:

Conhecido na região costeira da Andaluzia por Atum Vermelho, é uma espécie encontrada no Oceano Atlântico e no Mar Mediterrâneo, com uma estória de existência, que se estende muito para além da própria história do ser humano.

Este atum, ao longo da sua vida, percorre milhares e milhares de léguas de rotas marítimas, por zonas tão distantes do Atlântico norte, como as águas da Noruega ou do mais central, como o Golfo do México e Cabo Verde. Ao longo do seu percurso, vai-se alimentando com uma ementa muito variada, desde as anchovas às cavalas ou até mesmo polvos e algas; tudo isto para se fortalecer, munindo-se de enormes reservas de gorduras, para que possa dar início à sua viagem anual, entre os meses de maio e junho, rumo ao seu destino de desova … as águas quentes do Mediterrâneo.

E é precisamente antes de passar a fronteira para o Mediterrâneo, que os atuns encontram desde há milhares de anos, alguns caçadores que aguardam astuciosamente a sua passagem.

As orcas …

Cientes de que é chegada a altura dos atuns se dirigirem ao longo da costa em direção ao estreito de Gibraltar, organizam a sua “matilha” para dar caça aos enormes cardumes; até porque, agora estão mais apetecíveis do que nunca antes … grandes e ricos em nutrientes.

Mas não são só as orcas que os aguardam!

Os homens …

Sabendo ancestralmente desta migração, habituaram-se a observar os seus movimentos, socorrendo-se muitas vezes de pontos mais elevados, como é o caso da Gruta de Atlanterra ou Cova das Orcas, sobranceira à praia de Zahara de Los Atunes, onde permanecem algumas gravuras dessas observações e outras que apontam para os 5 mil anos! Também algumas torres de vigia serviam um duplo propósito, como a vigilância costeira e as migrações sazonais do peixe.

Esta relação entre o homem e o Atum Vermelho – apelidado de ouro vermelho – veio a trazer grande prosperidade para as populações locais que se iam fixando na zona. Um caso notável de grande desenvolvimento e riqueza da região durante a época romana, foi o da impressionante cidade de Baelo Cláudia, na Praia de Bolónia, Tarifa, onde existiu a maior exploração de atum da época e onde ainda é possível visitar as suas ruinas bem conservadas.

Rota Milenar do Atum Vermelho - Gruta de Atlaterra ou Cova das Orcas - Alma de Aventureiros

Cueva de las Orcas – Foto créditos: Instituto andaluz de Património histórico.

 

Torre de Guzmán - Conil de La Frontera - Rota Milenar do Atum - Alma de Aventureiros

Torre de Guzmán em Conil de La Frontera.

 

Rota Milenar do Atum Vermelho - Baelo Claudia - Tarifa-Cadiz-Espanha-Alma-de-Aventureiros

Ruinas romanas de Baelo Claudia.

 

Ao longo dos tempos os homens foram desenvolvendo e aperfeiçoando algumas engenhosas armadilhas com vista à captura dos cardumes de atum, acabando por resultar numa técnica que ainda hoje se mantém.

A Almadraba …

É uma palavra que provém do árabe, que significa um lugar de luta e morte, e que acabou por designar a armação utilizada para a pesca do atum.

Consiste na montagem sazonal de um labirinto de centenas de metros de cabos de aço, com redes de pesca fixas ao fundo, através de dezenas de pesadas âncoras de ferro e que forçam o atum a se dirigir para o “copo”; um cerco final constituído por uma rede suportada por barcos e que se vai fechando, à medida que os atuns de maior dimensão, vão ficando retidos nas suas malhas.

 

 

 

Por fim, o peixe – antigamente – era puxado para o interior das embarcaçõe, com recurso as ganchos, onde ficava a agonizar e esvair-se em sangue. Com o tempo, esta técnica foi considerada cruel, além de que a carne do atum perdia imensas qualidades, devido ao stress causado.

Rota Milenar do Atum Vermelho - lmadrabas - o antigamente - Alma de Aventureiros

Foto créditos: Restaurante El campero

 

Alguns relatos históricos indiciam para o facto da técnica de pesca com almadrabas já ser utilizada desde há cerca de três mil anos por fenícios e pelos romanos; contudo, os relatos mais consistentes, apontam para que esta técnica tenha sido implementada pelos muçulmanos durante a sua longa presença por terras de Al-Andaluz, que abrangia uma boa parte da actual Andaluzia e do Algarve.

Esta tradição pesqueira estendia-se um pouco ao longo da costa sul de Portugal e por toda zona costeira de Espanha, até Tarifa.  

Em Portugal, mais propriamente em Tavira, a indústria pesqueira do atum, através da técnica de almadravas, foi abandonada por volta de 1970, quando terá sido pescado nesse ano, o último e único atum da época, encontrando-se as âncoras utilizadas na técnica, um pouco em estado de abandono, no local onde terão sido deixadas pela última vez, no Arraial Ferreira Neto, na Ilha de Tavira.

A fábrica Ferreira Neto chegou a albergar dezenas de trabalhadores com as suas famílias, existindo no Arraial, para além das casas de habitação, uma escola, uma capela e uma cantina … agora, tudo convertido num empreendimento turístico, que dispõe de um pequeno museu dedicado à arte da pesca do atum com almadravas.

 

A actualidade – Em busca da sustentabilidade …

Por terras andaluzas, também esta técnica esteve em sério risco de desaparecimento, pois por meados da década de 70, já só restava um único local da zona costeira da Andaluzia, que mantinha a sua tradição ancestral de pesca por almadrabas.

Os japoneses, grandes apreciadores desta espécie de atum e os seus maiores consumidores mundiais, descobriram naquela altura, na costa de Cadiz, esta forma ancestral de captura única no mundo.

Vendo aqui uma grande oportunidade de negócio, voltaram a dinamizar a pesca com almadrabas em conjunto com os pescadores espanhóis, colocando contudo algumas exigências, para que o atum pudesse chegar aos mercados nipónicos e aos consumidores finais, nas condições ideais, nomeadamente, dando primazia à qualidade em detrimento da quantidade.

Também as autoridades espanholas implementaram medidas; agora as malhas são maiores, para permitirem a passagem dos atuns de menor porte a prosseguirem a sua migração, assim como o peso mínimo de cada peixe, que não pode ser inferior a 80 quilos, além da quantidade em tonelagem do peixe que se pode capturar e a forma como o atum é retirado do mar.

Posteriormente o atum tem que ser colocado o mais rápido possível na arca de gelo da embarcação e em menos de duas horas, tem que dar entrada no centro de corte e tratamento, para finalmente ser congelado em temperaturas inferiores a -60ºc.

Desde sempre que na Andaluzia se comeu atum confecionado das mais variadas formas, mas os japoneses como grandes apreciadores, também têm milhentas maneiras de o consumir. Entre elas, talvez a mais comum, seja o famoso sashimi, podendo o quilo do atum nos mercados japoneses atingir os mil euros!

A pesca com almadrabas já não é só uma tradição; é um nome, uma marca e acima de tudo um exemplo, que demonstra que é possível recuperar uma arte de pesca ancestral e colocá-la ao serviço da sustentabilidade dos ecossistemas.

 

 

ℹ️ Visitar Barbate:

Situada a meio caminho entre Zahara de los Atunes e Vejer de La Frontera, Barbate é um destino de viagem único em Espanha.

Barbate faz parte de toda uma região com uma longa tradição de pesca de atum. A gastronomia local foi criada a partir deste ingrediente único, tornando-a rica e variada. Barbate oferece-lhe a oportunidade de experimentar as suas tradições, cultura e iguarias. E se tudo isso não bastar para o cativar a partir à descoberta, esta região ainda o surpreende com praias de sonho e deslumbrantes parques naturais.

Basta percorrer esta costa e, independentemente da direção de por onde nos aproximamos de Barbate, percebemos ainda ao longe, que estamos diante de uma autêntica povoação piscatória.

O seu distanciamento das grandes cidades mais próximas, conferem-lhe a beleza dos melhores enquadramentos naturais que possamos imaginar! Por um lado, a estreita  estrada que nos transporta sobre o rio Barbate e as extensas e planas “marismas”. Pelo outro, “La Breña”, um infindável mar de pinheiros que só termina nas falésias sobre o Atlântico e num abraço a este povoado branco … como uma pérola branca que o mar ofereceu à costa da Andaluzia!

📸 Barbate | Foto reportagem.

 

De uma forma geral, a arquitetura de barbate é de construção recente, pelo que não se encontram grandes monumentos históricos.

Ainda assim, destacam-se o edifício da Câmara Municipal e a Igreja de São Paulino, mas como estamos na cidade do atum e é a sua história que procuramos por aqui, nada como uma visita à antiga “Chanca” – antigo armazém de salga e preparação do atum – e como não poderia deixar de ser, aquele que para nós é o grande ex-líbris da pequena cidade, o Mercado Abastecedor de Barbate …

 

O mercado é alías, o próprio coração da cidade, pois basta entramos para perceber que é ali que se sente o pulsar das gentes desta terra; tanto no seu interior, como no exterior.

Mal se entra e é impossível não ficarmos fascinados pela pintura do seu teto, exemplarmente representativa da pesca do atum com almadrabas e da sua rota migratória. Nas suas laterais, as muitas bancas com os mais variados produtos que a região tem para oferecer … e se dúvidas houver sobre as suas qualidades, os sentidos não nos enganam … vê-se e cheira-se a frescura em cada textura, em cada cor e em cada detalhe. E depois … as pessoas que, mais do que virem às compras, ainda por aqui se perdem saudavelmente em dois dedos de conversa.    

Por aqui dificilmente se encontram produtos embalados, o que se encontra são os conselhos e os esclarecimentos de cada vendedor em cada banca, que nem precisam de nos tentar cativar a comprar, porque cada produto vende-se por si próprio.

Em Barbate já existem alguns pequenos hipermercados mas … é aqui que se sente a cidade. Como é bom entrar, sentir e perceber a pulsação de um mercado tradicional.

 

 

E nós lá acabámos por também nos abastecermos, e claro está, que não poderíamos resistir a umas boas postas de atum vermelho.   

Estas, já cá fora, numa das muitas esplanadas que servem logo ali na hora, os produtos mais frescos do mercado.

Barbate - Rota Milenar do Atum Vermelho - Alma de Aventureiros

 

 

E porque estamos na capital do Atum Vermelho, nada melhor do que uma visita ao Museu do Atum de Barbate – La Chanca , para compreendermos a história por detrás desta tradição milenar, que aqui, nesta região costeira da Andaluzia, dá pelo nome de Almadraba.

Barbate - Rota Milenar do Atum Vermelho - Alma de Aventureiros - 013

 

O museu do atum encontra-se localizado na zona industrial de Barbate, em El Olivar, junto ao Parque Natural La Breña y Marismas del Barbate.

Para visitar o museu, tem que efetuar marcação, já que as visitas são condicionadas em número de participantes e uma única vez ao dia. Além do museu, o local possui ainda uma loja com os mais variados produtos, que também pode adquirir através da loja online. 

 

A visita é guiada e é explicada toda a história da tradição da pesca com almadrabas, desde os seus primórdios, até à actualidade.

Por fim, somos contemplados com uma apresentação ao vivo do famoso “ronqueo”, que consiste nos diversos cortes do atum, onde literalmente todo o peixe é aproveitado, daí também este atum ser por aqui conhecido como o porco do mar , devido ao seu integral aproveitamento.

A técnica do “ronqueo” também é por si só uma técnica de corte milenar, estando o seu nome ligado ao momento em que a faca passa pela espinha dorsal do atum para separar os seus lombos principais, em cujo som se assemelha a um ronco. 

Por fim, somos convidados a degustar alguns preparados de atum … sem dúvida do melhor que já provámos e uma experiência inesquecível! 

 

 

ℹ️ Outros locais a visitar na região:

Ao visitar Barbate não nos podemos despedir sem descobrir a sua lota e o cais de pesca, sobretudo logo pela manhã antes do Sol nascer, ou quando os “almadraberos” voltam com a recompensa tão desejada, os atuns. 

📸 Barbate | Foto reportagem.

   

Mas para quem queira presenciar ao vivo o trabalho artífice destes homens, nada como embarcar com uma das empresas promotoras de turismo: O restaurante El Campero ou com a Cadiz Atlantica, que o levam a assistir a todo o processo de pesca … desde a partida para o mar, ao cerco e “levante” do atum, ao transporte, corte e por fim também a uma degustação. 

Zona ribeirinha de Barbate.

Outro local de visita imprescindível é um passeio pela zona ribeirinha junto ao rio Barbate. Para jusante, pode observar as suas “marismas” ou pântanos, com uma grande extensão, repletos de fauna e com ínumeros passadiços e trilhos para percorrer.

Se descer para a costa, poderá ainda desfrutar das vistas proporcionadas pelas dunas sobre a barra e toda a baía da cidade.

 

Marginal e Praia de Calomadre.

Também a marginal é um óptimo local para uma caminhada descontraída, onde pode usufruir das agradáveis esplanadas do mutos restaurantes.

A praia de Barbate ou Calomadre tem um muito extenso e largo areal, onde encontrará águas de temperaturas muito agradáveis e um óptimo lugar para desfrutar em família com os mais novos.

 

Parque Natural de La Breña e Praia de caños de Meca.

Este é provavelmente um dos parques naturais mais pequenos de toda a Espanha, mas é também em simultâneo um daqueles que concentra uma das maiores biodiversidades de fauna e flora. Apresenta um amplo pinhal que aqui dá pelo nome de Brenha. Desenvolve-se sobre uma plataforma com o seu ponto mais alto acima dos 100 metros do nível do mar e que se estende até ao litoral, onde termina em impressionantes falésias, com vistas arrebatadoras sobre a baía de Barbate de um lado, e do outro a fascinante baía de Caños de Meca com o seu imponente Farol de Trafalgar … um lugar que ficará para sempre nos nossos corações e onde seguramente iremos voltar.

 

Praia de Zahara e Praia de caños de Meca.

Para o lado oposto, e a meio caminho entre Barbate e Tarifa, encontramos a bonita vila piscatória de Zahara de Los Atunes, onde nos podemos deliciar com mais algumas deslumbrantes praias.

 

 

DICAS DE AVENTUREIRO:

Resumo de locais a visitar na região:
  • Zahara de Los Atunes;
  • A cidade de Barbate com o seu museu do atum, o mercado, o porto de pesca, as visitas às almadrabas;
  • O Parque Natural de La Breña e Marismas de barbate;
  • Caños de Meca e farol de Trafalgar.

 

📌 Sugestões de alojamento e restauração.

Em toda a região, e por se encontrar inserida num parque natural, não existem os tradicionais hotéis normalmente dedicados ao turismo mais massivo.
Por aqui, tanto os hotéis como os alojamentos de turismo local ou rural, estão perfeitamente enquadrados na paisagem envolvente, e pelo facto de se encontrar numa área protegida, faz também com que se torne um pouco mais complicado encontrar alojamento, sobretudo para quem procura ficar em primeira linha de mar!
Assim, o melhor mesmo é reservar com bastante antecedência, ou como nós, visitar fora da época alta. 
Como é habitual, deixamos os “links” dos locais por nós experimentados. Desta vez elegemos o Camping Faro de Trafalgar para a nossa estadia, e para o almoço, o restaurante Majares Del Sol, em pleno Parque Natural de La Breña, a caminho de Caños de Meca, uma verdadeira agradável surpresa … inesquecível!
Mas para quem quiser saborear as melhores iguarias do verdadeiro atum selvagem de Almadraba, aconselhamos aquele que é considerado o melhor restaurante de confeção de atum, do mundo … El campero.

📧 Reservar visitas e tours guiados:

🍴 Onde comer:

🛏 Onde ficar:

Em Hotel ou alojamento local

Em autocaravana

 

 

 

 

🎥O nosso vídeo documentário

 

📖 Este artigo faz parte da 👉 Rota Milenar do Atum Vermelho

 

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