Há lugares e momentos que nos fazem parar e perceber o verdadeiro sentido da felicidade …
Estamos deitados sobre a areia, neste pequeno pedaço de paraíso na terra; o ilhéu das Rolas em São Tomé e Príncipe. O Sol já desce sobre o horizonte, conferindo-lhe agora, cores de um laranja fogoso ímpar, que talvez só se observem sobre esta linha invisível do equador!
A Sofia pergunta-me no que estou a pensar, talvez pelo facto do meu olhar se encontrar distante! Por um instante, olho para ela e para o Hugo; o meu olhar volta-se de novo para o local onde estava a minha mente. Tento observar mais além. Atravesso o canal que se encontra à minha frente, onde os meus olhos penetram na neblina tropical e levam os meus pensamentos por cima e ao redor do verde manto daquela floresta … aquela Obô. Sinto-me a pairar sobre todos os momentos destes últimos dias aqui vividos!
Um pouco afastada, encontra-se uma senhora a trabalhar para o Resort. Percorre a praia a apanhar as folhas que vão caindo sobre a areia. Desperta-me sobretudo a atenção, o facto de cantar enquanto trabalha! Canta alto, em tons de inconfundível e contagiante alegria.
O seu cântico faz-me viajar para um outro tempo, para um outro lugar …
Recorda-me de onde venho, num tempo em que as pessoas cantavam nos campos enquanto trabalhavam. Num tempo em que saltávamos à corda, brincávamos aos berlindes, ao pião, com caricas no chão e um velho aro ou pneu, que alegremente fazíamos deslizar. Num tempo, em que nos dávamos mais tempo. Num tempo, onde tínhamos menos, mas talvez tivéssemos mais …
O que aconteceu ao tempo e ao lugar de onde venho?
Tudo parece agora correr de forma frenética, sem deixar tempo para nada! Onde de forma latente, o consumo tolda o juízo e envenena a alma, roubando grossas fatias à alegria das pessoas, que o confundem com bem-estar.
Onde sem me dar conta, sem saber muito bem como, nem porquê, perdi a noção do objectivo de ter começado a correr, e pelo caminho, já quase perdi a noção de onde parti, questionando-me agora em que sentido quero continuar!
Dou por mim neste ensaio mental sobre a felicidade … afinal, o que é preciso para se ser feliz?
Sinto que preciso parar. E depois, fechar os olhos para lentamente os abrir de novo, como se fosse a primeira vez; abri-los e ver … realmente ver.
Ver, sentir, escutar e absorver tudo o que me rodeia. E então, talvez seja possível vislumbrar a felicidade nos momentos mais simples que ocorrem ao meu redor, quando me permitir desacelerar, parar e simplesmente viver.
São Tomé e Príncipe foi como um despertar!
São muitas as crianças de São Tomé, tantas quanto os sorrisos que nos é possível imaginar, e não poderá estar mais enganado, quem vê pobreza em crianças que, todas nuas e sem preconceitos, saltam sorridentes na areia e mergulham neste mar.
Aqui, sinto-me pequeno … e sou pequeno.
Pequeno, perante os pescadores que esculpem as suas tão frágeis canoas para irem pescar, podendo acabar no Gabão, em Angola ou no fundo do mar.
Pequeno, perante as mulheres que carregam as crianças, e nos rios lavam e secam as roupas a cantar.
Pequeno, perante as crianças que da madeira, fazem as suas bicicletas, das latas os seus carrinhos de brincar, e que diariamente, para irem à escola, enfrentam o mar.
Aqui, neste lugar, neste mundo que me parece agora tão real, o pouco é muito e de onde venho, o muito, parece quase sempre ser pouco!
Aqui, neste lugar, não há pressas. Há tempo para as pessoas e para as conversas. Há tempo para se cumprimentar quem passa, com um simples e tão rico bom dia ou um acenar da mão, mesmo que ao longe.
Há tempo para as brincadeiras e há tempo para os sorrisos.
Não há muito, mas há tanto, onde o pouco é muito e o muito … talvez, tão simplesmente, não faça falta!
Bomu Kêlê São Tomé e Príncipe.
📸 Curto ensaio sobre a felicidade.
Este artigo, faz parte da série de crónicas “Pessoas e Momentos“.