Ao meu sogro – um pastor da Serra do Açor, um agricultor … um senhor.
Porque há estórias que merecem ser contadas e escutadas!
Quando planeei esta estória, pensei escrever sobre algo que considero mais que uma nobre profissão; os pastores da serra, um modo de vida de pessoas, que têm amor pelas suas raízes, pela sua cultura e tradições; de tal forma, que as leva a perpetuá-las no tempo e a permanecerem nas terras que as viram nascer. A paixão pela serra, pela terra e pelos animais.
Um amor inabalável, uma ligação tão forte, que só se compreende, quando se sente!
Mas creio que este estranho tempo que atravessamos, me tenha impulsionado a escrevê-la, não da forma como havia idealizado, mas de uma forma um pouco diferente.
Não é fácil contar estórias de quem nos é próximo. Poderia falar de tanta gente que me é querida, de tanta gente que me é especial: os meus filhos, a minha esposa, os meus netos, a minha sogra, os meus cunhados e cunhadas, sobrinhos e sobrinhas, amigos … talvez colocar toda a família e amigos dentro de uma estória, ou até mesmo uma pequena aldeia do meu coração!
Mas esta, é uma estória, e um pouco da história de uma pessoa em particular.
Ao meu sogro:
Talvez alguma das suas filhas lhe esteja a ler estas minhas palavras, talvez alguma das suas netas ou netos …
Esta estória é para si.
Sabe Senhor Jorge, já perdi a conta às vezes que a Sofia, orgulhosamente me contou estórias da infância dela, do crescimento, da educação, das aventuras vividas na aldeia do Casal de São João! Escuto-as sempre com atenção, como se fosse a primeira vez.
A história de um homem resistente de uma aldeia do interior. Estórias de um homem de trabalho, de um agricultor, de um pastor, de um tocador de acordeão … de um homem que, quase sozinho, ergueu uma casa sobre os fortes alicerces da família. Estórias de um homem que, numa pequena mota, de manhã à noite, ao Sol e à chuva, percorreu serras, vales e aldeias como ninguém! Um homem sempre pronto a ajudar. Estórias de vida … de um marido, Pai, Avô e amigo.
E sabe Senhor Jorge, o protagonista … o herói presente em todas as estórias da sua filha, é você!
Como eu gosto de ouvir a minha Sofia, a contá-las!
Nunca me esquecerei da primeira vez que me deslumbrei com essa aldeia da falda da Serra do Açor … sim, aí, no Casal de São João, essa aldeia que aprendi a chamar de minha.
Nunca me esquecerei da primeira vez que me sentei naquela mesa comprida da sua garagem, rodeado por uma família, que a Sofia disse que também seria a minha e que, agora é mesmo a minha! Não era só uma mesa comprida com pessoas ao redor; era muito mais do que isso! Era uma mesa de união, farta em família, abastada em carinho, em conversas repletas de sorrisos e alegria, contagiados pelo som de um acordeão.
Nunca me esquecerei dos sorrisos rasgados de genuína cumplicidade entre todos, e do seu … orgulhosamente, enquanto tocava aquele enorme acordeão, em cada compasso, dividia o olhar entre as teclas e por quem o rodeava.
Dos reflexos daquele momento, dei por mim a pensar no sentido da plena felicidade na vida de um homem, nesta passagem … quando nos é dado o privilégio de chegarmos a uma certa etapa e termos ao nosso lado, a companheira de uma vida, as filhas, as netas, os genros e os amigos … afinal, poderá lá haver melhor!
Mas um dia, o som do acordeão apaziguou-se; fechado numa caixa e abafado pelo anúncio de uma batalha, e a sua luta começou …
Não sabia a doença que havia batido à porta errada e desafiado um homem de coragem; bateu à porta de um homem da serra, um homem que não vira a cara a nada, nem nunca de nada desistiu.
Lentamente, as nuvens escuras dissiparam-se, rasgadas pelos raios do Sol que regressou. A caixa voltou-se a abrir uma vez mais e o som do acordeão voltou!
Sabe Senhor Jorge; gosto muito de me recordar de tudo isto, assim como gosto das estórias da minha Sofia.
Mas sabe Senhor Jorge, mais do que as orgulhosas narrativas da Sofia, o que eu mais gosto, é de chegar à minha aldeia, sentar-me à sua beira, junto a esse fogão de lenha e de ouvir todas estas e outras estórias, contadas por si!
Obrigado por me ensinar, como são tão belas, as simples coisas da vida.
O meu Sogro – Um Pastor da Serra do Açor.
Este artigo, faz parte da série de crónicas “Pessoas e momentos“.
2 Comments
Ótimo trabalho!
Após perder muito tempo na internet encontrei esse blog
que tinha o que tanto procurava.
Parabéns pelo texto e conteúdo, temos que ter mais
artigos deste tipo na internet.
Gostei muito.
Meu muito obrigado!!!
Muitíssimo obrigado!